História de prefeita mostra como a educação integral transforma vidas
- Em 9 de maio de 2022
Prefeita de Bezerros, Maria Lucielle Laurentino vê o incentivo aos estudos como um meio para que os jovens possam realizar sonhos
Em 2007, Maria Lucielle Silva Laurentino, então com 18 anos e concluinte do ensino médio, decidiu que queria melhorar a educação do Brasil em um cenário de 10 anos. Desejava que outros jovens como ela tivessem a oportunidade de estudar em escolas que além da qualidade pedagógica, os estimulassem a sonhar e buscar meios de realizar esses sonhos.
Foi aluna do segundo colégio integral implantado na rede estadual de Pernambuco em 2005, na cidade de Bezerros, no Agreste e distante 107 quilômetros do Recife. Virou professora, ganhou bolsa para fazer mestrado na Espanha, trabalhou no serviço público e no terceiro setor. Hoje, aos 32 anos, é prefeita do município pelo partido União Brasil. Coloca em prática, na gestão pública, muito do que aprendeu nessa escola. E conta, só no primeiro escalão, com quatro secretários municipais também egressos do ensino integral. Além da vice-prefeita, Socorro Silva, 74, que foi diretora do colégio que ela estudou e uma das suas principais incentivadoras.
“Tenho certeza de que a educação transformou minha vida, foi um divisor de águas. Todos os elementos que me foram oferecidos na escola integral garantiram quem eu sou hoje. Dificilmente uma pessoa com meu contexto social, filha de feirantes, vinda da zona rural, teria perspectiva de ir para a faculdade ou almejava chegar a outros lugares”, diz Lucielle, que morou até o fim da adolescência na Serra Negra, distrito de Bezerros, onde vivem seus pais e uma irmã, localizado a 10 km do Centro da cidade. Ela ressalta a importância dos pilares que norteiam o modelo de ensino integral de Pernambuco na sua trajetória. “Uma escola voltada para a vida, baseada em protagonismo, em projeto de vida, em fazer o jovem ser parte da solução de problemas”, comenta a prefeita de Bezerros.
A oferta de ensino integral no ensino médio começou na rede estadual, de forma experimental, em uma única escola, o Ginásio Pernambucano, que fica na Rua da Aurora, no Centro do Recife, em 2004. Partiu da proposta feita pelo então presidente da Philips e ex-aluno do GP, Marcos Magalhães, ao governador Jarbas Vasconcelos. A Escola de Referência em Ensino Médio de Bezerros, onde Lucielle estudou, foi a segunda unidade implementada. Atualmente, Pernambuco tem 576 colégios integrais, dos quais 58 são escolas técnicas. Cinco estão em Bezerros. Há 206 mil alunos (em um universo de 308 mil estudantes do ensino médio matriculados na rede estadual).
INQUIETAÇÃO
O conceito por trás da escola integral “de formar pessoas para mudar o mundo”, segundo Lucielle, foi que a instigou a entrar na carreira política. Em 2014 ela estava concluindo o mestrado na Espanha e já com doutorado aprovado no mesmo país. Faltavam apenas três anos para cumprir o que havia planejado lá atrás, em 2007, de ajudar a melhorar a educação pública brasileira.
“Em 2013 houve o Movimento Vem pra Rua. Em 2014, o Brasil estava inquieto, teve eleição para presidente. Eu estava bem no exterior, com bolsa, mas me senti egoísta porque aprendi na escola que precisamos ajudar a solucionar problemas, a nos responsabilizar por aquilo que a gente faz parte. Desisti do doutorado e retornei para o Brasil”, afirma.
De volta, trabalhou até 2018 no Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE), presidido por Marcos Magalhães. Juntamente com outros jovens egressos de escolas integrais, ajudou a implementar o modelo em redes públicas de 17 Estados brasileiros. Também com o apoio de um grupo desses colegas decidiu se candidatar a deputada estadual nas eleições de 2018 pelo partido DEM. “Convivendo com governadores e prefeitos, ficou mais claro para mim que independente de partido, o que impede a educação de funcionar é a política. Por mais certeza que a gente tenha que a educação transforma o mundo, se a política não quiser, não funciona”, diz.
Não ganhou em 2018. Mas não parou. Em 2020, sem muitos recursos financeiros, nenhuma tradição na política de Bezerros e sem apoio da elite local, disputou a prefeitura de Bezerros e venceu. “Nosso mandato surgiu dessa onda de pessoas comuns e do bem que querem mudar o Brasil. A gente acredita que vai governar o Brasil a partir da nossa cidade. Queremos chegar até a presidência da República sim. Se não eu, outro prefeito que veio de escola integral ou é um jovem e inovador e que se conecta com o mesmo propósito da gente”, enfatiza Lucielle, que na última sexta-feira aceitou convite de coordenar a campanha de Miguel Coelho para o governo do Estado.
GESTÃO
A maneira como está administrando a cidade de Bezerros, que tem cerca de 60 mil habitantes, também foi aprendida na escola integral. “Aprendi lá que a gente deveria planejar metas, indicadores de resultado e que precisamos prestar contas”, afirma Lucielle, que estimula os moradores a acompanharem os recursos empregados na sua gestão por meio do portal da transparência. Há planejamento, monitoramento, com ciclos de acompanhamento e metas para cada secretaria. Pastas importantes como de Administração, da Fazenda, de Infraestrutura e de Agricultura são conduzidas por egressos das primeiras turmas de escolas integrais de Pernambuco: Bruno Clisman, Marília Mota, Samuel Santos e Thaís Santos, respectivamente.
Com uma rede municipal de ensino formada por 38 creches e escolas (três na zona rural), 6.371 alunos e 364 docentes, ela está investindo na melhoria da estrutura física das unidades. “Sei que a educação é a área que há a maior expectativa da população sobre a nossa gestão. Estamos reformando todas as escolas, compramos computadores para os professores, vamos dar fardas para os alunos e melhorar a merenda”, explica a prefeita.
COBRANÇA
Pela história dela, a cobrança para que implemente escolas integrais nas unidades municipais é grande. “É contraditório o município que foi a âncora para replicar o modelo integral em Pernambuco não tenha uma escola municipal integral no ensino fundamental. Hoje são mais de 3 mil escolas integrais no Brasil. Mas temos que começar com condições mínimas. Por isso estamos estruturando para iniciar em 2023”, diz Lucielle. O plano é criar, ano que vem, dois colégios integrais para séries finais do fundamental (6º ao 9º ano).
“Bezerros tem um trabalho historicamente muito aguerrido na educação, fruto de uma construção coletiva. Quero ser uma boa gestora na educação e que a nossa maior entrega seja na educação. Desejo melhorar os indicadores e os resultados, mas mais do que isso, nossa ambição é que as pessoas olhem pra gente e se inspirem que podem estudar e realizar seus sonhos. Se a minha escola garantir que meu aluno tenha essa possibilidade de sonhar, eu vou ficar muito feliz”, ressalta Lucielle, e emenda: “Vou me esforçar para isso.”
Fonte: Uol
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